30 de abr. de 2013

Mar revolto


Acho que não existe momento mais especial na vida de um homem que o nascimento de seu filho. No meu caso foi uma filha. Marina, que lembra mar. Mar, que é uma das coisas que mais amo na vida. Marina foi uma onda avassaladora que invadiu minha praia, deu-me um caldo e quase me afogou. Menina linda, de olhos negros, que nasceu com os cabelos escuros e que, ao caírem, deram lugar a cachos dourados. A minha cara, muitos diziam quando bebê e o dizem até hoje. Nos primeiros dias foi um susto danado. O que aquela menina tão frágil, tão pequenininha desejava de mim? O que ela esperava que eu fizesse por ela? O susto, aos poucos, foi se transformando em um grande medo. Será que eu daria conta daquele recado? Será que eu saberia interagir com aquela boneca que viera sem manual de instrução? Eu, como a maioria dos homens, que fora proibido de brincar de boneca na infância, agora tinha um exemplar vivo em minhas mãos.

Confesso que os primeiros meses de vida de Marina bagunçaram minha cabeça de um tanto que eu não mais sabia quem era e onde estava. Tal como o mar em dia de tempestade, minha vida encontrava-se revolta, cheia de ondas tão grandes que parecia impossível surfá-las. Vi que eu era um surfista de primeira viagem.




Aos poucos aquele mar foi se acalmando, o medo foi se transformando em paixão e a paixão deu lugar à um imenso e sereno amor. Sinto que não é possível medi-lo, saber a sua profundidade ou extensão. A paternidade é algo que - tenho certeza - foi feita na medida para mim.


Adoro representar e viver este papel. Também pudera:, a mim foi dado o privilégio de contracenar com uma atriz de primeira grandeza. Quando Marina sobe ao palco, não tem para ninguém. O público fica embasbacado e sabe que ali se encontra uma pequena diva, hoje com dez anos. Marina continua uma menina de cabelos dourados, já não mais cacheados.


Não tenho dúvida de que este foi o melhor presente surpresa que a vida pôde me dar.


Marina, minha filha: obrigado por ter invadido minha praia.


Você tem a mesma energia do mar. É, em si mesma,  um oceano que a gente aprende dia a dia a navegar.


A inspiração para MAR REVOLTO surgiu a partir do cenário (bonequinhas de tricô) que utilizei fotografar a etiqueta que desenvolvi e produzi para a MONDOPANNO. Estas bonequinhas fizeram-me lembrar do nascimento de minha filha e, a partir daí, foi só deixar  a inspiração conduzir minhas mãos e confeccionar o texto.

A MONDOPANNO é uma empresa que produz bonequinhos feitos em tecido. Todos os modelos disponíveis são criações próprias da marca e traduzem o universo particular de sua criadora. Eles são realmente incríveis e valem uma visita ao site da empresa (www.mondopanno.com.br) para conferir o trabalho de perto.





As bonequinhas utilizadas como cenário foram garimpadas por mim e não são da MONDOPANNO.

Devido às dimensões pequenas dos bonecos da MONDOPANNO, tivemos que fazer uma etiqueta em  tamanho pequeno (7 x 32 mm), porém que passasse o universo colorido e lúdico da marca. Foram cinco as cores bordadas sobre fundo branco.












Recado do dia: Quem diz que veio ao mundo a passeio esquece-se de todos aqueles que no passado trabalharam por ele.

27 de abr. de 2013

Olha o trem



Ainda posso escutar ao longe o apito do trem.

O trem sempre esteve presente em minha vida. Ele passava bem em frente à chácara de vovó Rosa, nos arredores de Araçatuba.

O víamos com muita frequência, seja dentro do carro, enquanto o esperávamos passar, seja de bicicleta, quando fazia o percurso pedalando de casa até lá junto com os amigos, ou através do desenho da grade do portão da chácara, quando lá dentro já nos encontrávamos.

Às vezes ele passava com seus vagões carregados de grãos, outras vezes passava com os mesmos vazios. Quem tem ou já teve a vida cotidiana cortada pela linha de trem sabe o respeito que devemos manter diante dele. Não dá para vacilar. Bobeou, dançou. Foram muitas as tragédias que ouvi na infância. Ele chegou a levar embora algumas pessoas conhecidas e - em especial - uma bem próxima da família.

Antes de cruzar a linha de trem é preciso uma atenta vigilância. A própria placa amarela em forma de cruz avisa: pare; olhe; escute.

Eu e a criançada amiga tínhamos um método particular para sabermos se o trem estava próximo ou não. Bastava colocarmos nossos ouvidos no ferro do trilho (isto quando o calor permitia) e ficarmos ali escutando por alguns segundos. A vibração do mesmo indicava que ele se encontrava bem próximo.

Esta linha de trem a que me refiro, cortava a cidade de Araçatuba ao meio. De um lado ficava a parte mais moderna da cidade, com seus melhores bairros. De outro ficava a parte mais periférica, com seus bairros mais simples. Podemos traçar aqui um paralelo com a velha Alemanha antes da derrubada do muro de Berlim: de um lado ficava a Alemanha Ocidental com toda a sua pujança capitalista, e de de outro, a Alemanha Oriental, sucateada pelo socialismo capenga.

Com exceção das idas e vindas à chácara, eu e minha família raramente cruzávamos a linha. Exceção era quando tínhamos as exposições de gado (uma vez ao ano) e quando levávamos alguma empregada de volta para sua casa depois de algum evento que se estendesse até tarde da noite.

Existiam em alguns pontos da cidade as chancelas junto à linha de trem. Elas eram constantemente vigiadas por guardas que - ao menor sinal da chegada do trem - abaixavam a mesma até que o último vagão passasse. Apesar disto, antes de atravessarmos, sempre parávamos e avaliávamos a situação. Afinal, vai que o guarda tivesse ido ao banheiro ou estivesse dormindo.

À título de modernização, depois de muito tempo e inúmeras tragédias acontecidas, o poder público resolveu mudar o traçado da linha para que o mesmo não mais cortasse a cidade ao meio.

Em seu lugar surgiram ruas e avenidas. Pensávamos que a partir dali o progresso iria chegar. Que nada, ele também mudou de rumo e nunca foi - se quer - visitar a cidade.

A crônica OLHA O TREM nos traz de volta um tempo em que o trem era peça-chave para o desenvolvimento de inúmeras cidades brasileiras, dentre elas, a capital de São Paulo. Os trens que aqui chegavam no final do século XIX tinham por parada obrigatória a estação da Luz, então conhecida como Companhia São Paulo Railway, de origem britânica.

Localizada no bairro da Luz, sua construção data de 1867. O projeto original é atribuído ao engenheiro inglês Henry Driver, e é similar à Flinders Street Station, uma estação existente em Melbourne, Austrália.
Toda a estrutura de ferro fundido que sustenta a construção foi trazida da Inglaterra por meio de peças pré-moldadas e montadas aqui.

Além de ser a porta de entrada para o café que aqui chegava, vindo do Sudoeste e Noroeste de São Paulo, e também do Norte do Paraná, para ser levado até o porto de Santos de onde era exportado, a estação também recebia os bens de consumo e de capital que abasteciam a cidade de São Paulo.

Entre 1900 e 2010 a estação passou por uma série de reformas, sendo uma delas comandadas pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha e seu filho Pedro Mendes da Rocha. O objetivo principal desta reforma foi a readequação do prédio para receber as instalações do Museu da Língua Portuguesa.

E foi lá, num final de tarde de domingo, que fui fotografar a etiqueta que fiz para a marca de roupa feminina com pegada moderna, WELT. WELT vem do alemão WELT e significa mundo.

































O cenário dá margem à um filme romântico. No meio do saguão encontra-se um piano onde quem quiser - e souber tocar - pode dar uma paradinha e fazer o seu recital.


























Recado do dia: O bilhete de sua passagem na Terra tem prazo de validade determinado. A gente só não sabe quando vai expirar. Por isso, trate de não sair por aí gastando os seus pontos acumulados para viajar na maionese.